- por Mariana Zambon Braga
Ah, a doçura de não fazer nada. Deitar na grama e observar as nuvens. Sentar à beira-mar e sentir a brisa no rosto, sem nenhuma intervenção de pensamentos como "tenho que fazer (insira aqui qualquer coisa". Sentar na cama e olhar para a parede. Observar a vida através da janela do seu apartamento. Meditar, ou apenas sentar e respirar por muito tempo. Sem celulares, sem tablets, sem livros, sem fones de ouvido. Fazer-absolutamente-nada-nadinha-nada-mesmo.
É isso o que significa a expressão italiana "dolce far niente". E fazer nada não quer dizer ler um livro, assistir a um filme, sair para encontrar os amigos - ou qualquer atividade que, para nós, significa um momento de relaxamento ou de aproveitar a vida. Significa ficar à toa, contemplar o tédio, em si mesmo.
Quando foi a última vez que você se permitiu ficar entediada?
A correria da vida nos ocupa o tempo todo. Pulamos cedo da cama, corremos para chegar ao trabalho, perseguimos prazos durante o dia inteiro, nos desdobramos para cumprir todas as tarefas cotidianas, corremos de novo para não perder o ônibus, trem, metrô, para chegar em casa a tempo de descansar. E, quando terminamos de cumprir as obrigações, ao menos sinal de tédio, lá vamos nós, mais uma vez, inventar atividades para preencher os instantes desocupados.
Se, por acaso, o corpo pede "escuta, deita ali na cama e fica sem fazer nada por uma hora, por favor?", logo ignoramos esse instinto. Tempo, de acordo com a nossa cultura, é dinheiro. Quando não estamos produzindo, estamos consumindo, pois tudo nessa vida é considerado como produção e consumo. Ou seja, uma hora improdutiva significa uma hora perdendo lucro, ou deixando de gerar lucro, números ou dados para alguém. É um sacrilégio ficar à toa. Quem é que tem tempo para isso?
Acredite em mim quando digo: você tem, sim, tempo para não fazer absolutamente nada.
Quanto dinheiro você perderá se parar por alguns momentos para ficar à toa com seu filho ou filha, companheiro ou companheira, apenas existindo lado a lado, compartilhando a vida? Qual será o prejuízo causado por sentar numa praça e observar os movimentos apressados dos transeuntes, das formigas, dos cães correndo atrás de uma borboleta? Ou de simplesmente deitar no chão da sala ou no sofá e olhar para o teto, sem expectativas? Quem sabe até o maior dos pecados - cochilar durante o dia!
Em nosso mundo cada vez mais veloz e conectado, a contemplação do nada pode parecer algo entediante e totalmente sem sentido. Para os artistas, no entanto, o tédio e o ócio podem ser os motores da criatividade, aliados indispensáveis para o surgimento de grandes ideias e epifanias.
Ficar entediado é uma coisa muito importante, um estado de espírito que devemos buscar. Uma vez que ficamos entediados, a nossa mente começa a vagar, buscando alguma coisa excitante, alguma coisa interessante para se estabelecer. E é justamente aí que a criatividade aparece.
Esta citação é do texto de Peter Bergman "Por que devolvi meu iPad". O autor conta sobre como ter um iPad e estar o tempo todo produzindo ou consumindo algo o tornou alheio à importância do "tempo perdido".
Quando estamos esperando por alguém, ou deitados na cama aguardando o sono que não chega, geralmente os pensamentos aparecem e começamos a colocá-los em ordem. Seja uma fagulha criativa ou um insight sobre a vida, em geral, estes instantes que erroneamente consideramos como perdidos nos proporcionam ganhos sem tamanho. O menor deles, certamente, é o benefício de amenizar o estresse.
Imagina só, que loucura, não "ter que" fazer nada - nem que seja por alguns minutos no dia? Confesso que, para mim, é bem difícil tirar um tempinho e me permitir esse dolce far niente - agora mesmo, eu poderia estar curtindo o ócio, mas estou aqui, usando meu tempo livre para escrever sobre a necessidade de ficar sem fazer nada.
Sendo assim, peço licença para encerrar o texto. Vou ali aproveitar o tédio!
Mariana Zambon Braga
Responsável pela redação da Rede, é tradutora de inglês, formada em letras pela USP.
Atua nas áreas de: contratos, traduções técnicas, traduções literárias, artigos e monografias. Escritora por vocação e realizadora por necessidade.